Se recuarmos um pouco na história, verificamos que grandes empresas foram criadas em momentos menos bons da economia mundial. A Microsoft, por exemplo, nasceu em 1975, quando os Estados Unidos viviam um momento financeiro complicado. Aí entra uma questão: os momentos de crise são bons para investir? Quando as pessoas não têm dinheiro para comprar, as empresas fecham por falta de vendas. Quando a taxa de desemprego aumenta, o Estado é obrigado a gastar mais dinheiro. Esta bola de neve constante aponta, em todos os sentidos, para não investir em qualquer área de negócio.
Em Portugal, esse mesmo investimento tem diminuído. Recentemente, a taxa de desemprego ultrapassou os 13%, algo difícil de imaginar num País onde a os desempregados não ultrapassavam os dois dígitos. Contudo, penso que nem tudo são más notícias. Posso me considerar suspeito para afirmar tal coisa, por ser demasiado otimista. Mas o passado recente continua a mostrar-nos que o que tem qualidade, vinga sempre, independentemente da altura em que se viva.
Ainda esta semana, dei-lhe o exemplo de 17 startups que têm crescido na Europa. Respondendo à pergunta do título, tenho tudo para acreditar que esta crise possa ser uma boa oportunidade para todos os freelancers. Mas antes de tudo, é necessário tentarmos perceber o que está a mudar com esta crise e o motivo pelo qual o regime de freelancing ser uma boa solução para o futuro, principalmente no Brasil e em Portugal.
O emprego para toda a vida está em decréscimo
Se há lição que podemos retirar de toda esta crise que está acontecendo na Europa é que o emprego para o resto da vida está a terminar. Caso os leitores brasileiros não saibam, agora qualquer empresário europeu e principalmente português, tem maior facilidade em despedir os seus empregados e pode obrigar o funcionário a trabalhar mais horas, não pagando muito mais por isso. Estes dois pontos negativos são, segundo os governantes, para estimular a economia, mas que acabam retirando uma das vantagens de trabalhar para outra pessoa: a estabilidade.
Nos dias de hoje, o emprego para toda a vida é escasso. De um dia para o outro, os chefes podem colocar o empregado para a rua sem grandes complicações. Só que estas mudanças estão prejudicando várias pessoas, especialmente aquelas que sempre foram habituadas a uma vida estável e a um salário fixo no final do mês. Alguém que tenha hoje 50 anos e que foi demitido, muito dificilmente vai voltar a conseguir emprego. E o choque psicológico da falta de estabilidade também tem sido outro fator negativo.
A estabilidade jamais entra no nosso dicionário. Podemos procurar a maior estabilidade possível, mas ela nunca é 100% garantida. Por isso, podemos considerar que já estamos habituados a este gênero de situações. Se não conseguimos clientes, tratamos de fazer a melhor divulgação possível ou procurar por novos projetos. Estamos habituados a esta luta constante do dia a dia, algo que uma pessoa que trabalhe para um chefe não sente tanta necessidade.
O trabalho a partir de casa vai aumentar
Para reduzir custos, as empresas estão deixando os seus trabalhadores produzirem a partir de casa. Pode parecer que não, mas esta é uma mudança muito grande para a maioria dos empresários. O ideia de que “se não estou vendo, ele não está trabalhando” tem mudado aos poucos. Infelizmente, esta confiança de que o trabalhador possa estar trabalhando, mesmo estando em casa, chegou apenas agora à Europa. No Japão, essa mentalidade já leva alguns anos de avanço.
O melhor exemplo de como alguns países asiáticos estão à frente de muitos europeus, aconteceu em meados dos anos 90. Enquanto alguns economistas de todo o mundo debatiam sobre a evolução das empresas no Oriente Médio, um cavalheiro japonês levantou a mão. Se apresentou como um dos gestores da Kobe Steel, então o quarto maior produtor de aço do Japão, que criticou o fato de os economistas não entenderem como se deve liderar em democracia. Veja algumas das palavras do seu discurso:
“Lamento dizer isto, mas vocês, economistas, não compreendem como o mundo real funciona. Tenho um doutoramento em metalurgia e trabalho na Kobe Steel há 30 anos, pelo que sei alguma coisa sobre aço. Contudo, a minha empresa é hoje tão grande e complexa que nem mesmo eu compreendo mais de metade das coisas que ali acontecem. Apesar disso, o nosso conselho de administração aprova habitualmente a maioria dos projetos apresentados pelos nossos colaboradores.
Acreditamos que eles trabalham para o bem da empresa. Se assumíssemos que toda a gente promove os seus próprios interesses e questionássemos permanentemente a motivação deles, a empresa deixaria de funcionar, pois gastaríamos o nosso tempo analisando propostas que realmente não compreendemos. Não é possível gerir uma grande organização burocrática se assumirmos que nesta vida é cada um por si”
Este discurso representa claramente o que é a mentalidade japonesa há alguns e que, infelizmente, só chegou à Europa por necessidade. Mais uma vez, como freelancers estamos preparados para esses tipos de situações. Enquanto que uma pessoa que passe de um dia para o outro a trabalhar em casa sente algumas dificuldades em cumprir prazos, os freelas já estão preparados para produzir sem ter um chefe por perto.
As empresas precisam de pequenos serviços
Com a crise, ficou caro contratar uma pessoa para desempenhar funções que não são essenciais. Imagine o trabalho de um fotógrafo. Para um jornal que esteja com dificuldades financeiras e que necessita de cortes nos trabalhadores, a primeira tendência é despedir os fotógrafos, visto que os redatores podem desempenhar o seu papel, apesar de o fazerem com menos qualidade. No entanto, a imagem continua a ser essencial num jornal, por isso é muito provável que o fotógrafo continue desempenhando algumas funções em regime de freelancing para a publicação.
Este é apenas um pequeno exemplo, entre muitos outros. Isto porque as empresas sabem que, no final, acabam por poupar se encontrarem uma pessoa para realizar apenas alguns serviços. Caso tivessem que pagar a tempo inteiro, seria bem mais dispendioso. Se o funcionário não tiver contrato, os empresários não necessitam de fazer os descontos para o Estado, que representa grande parte das despesas de uma empresa.
A vantagem da internet
Quem começou há pouco tempo o trabalho de freelancer, não tem noção de quanto a internet se tornou uma vantagem. Sites como o Logovia, o Resolva.me ou o Odesk facilitaram em muito a vida de todos os freelas. Além disso, criou várias hipóteses de emprego que não existiam antigamente como as aplicações ou os web designers. Já imaginou como as pessoas faziam há alguns atrás para divulgar o seu trabalho ou para conseguir emprego? Era muito mais difícil.
Além disso, tanto os freelancers brasileiros como os portugueses podem aproveitar o fato da língua ser semelhante para conseguirem trabalhos entre si. E nestes casos não falamos apenas em projetos para Brasil ou Portugal. Falamos de hipóteses de negócio com países como Angola, Cabo Verde ou Moçambique, que estão em franco crescimento e podem gerar boas quantias de dinheiro para os freelancers no futuro.
Quem souber explorar corretamente o mercado africano, poderá facilmente conseguir bons resultados dentro de poucos anos. Principalmente porque o conhecimento especializado nestes países é escasso. Eles necessitam de trabalhadores com vários anos de experiência, o que nos países deles é difícil de encontrar devido ao baixo nível de escolaridade. Já para não falar das pessoas de língua portuguesa e que são emigrantes, que é outro mercado possível de ser explorado.
A valorização do real
Com o euro em crise, temos assistido constantemente a uma valorização do real. Esta mudança pode representar uma excelente oportunidades para todos os freelancers que recebam nesta moeda, pois permite que tenham maior poder de compra perante os outros países. Atualmente, o euro ainda é mais forte, mas a economia brasileira tem crescido e muitos especialistas traçam um futuro risonho para o Brasil. Ao trabalhar como freelancer, tente cada vez mais explorar esse mercado para no futuro ter já alguns contatos interessantes.
Contudo, esta mudança na valorização do real também traz outra mudança muito importante: a diminuição do trabalho de baixo custo. Com o real valendo menos, o Brasil tinha uma grande vantagem relativamente a Portugal. É que ficava mais barato trabalhar com freelancers no Brasil, visto que o preço a pagar era mais reduzido. Mas essa tendência tem diminuído há alguns anos para cá. Hoje em dia, já não é tão barato pedir a um freelancer brasileiro para construir um site, por exemplo. Por isso está na hora de os profissionais desta área começarem a rever um pouco a sua política de negócio. Quem apostava no preço baixo como principal arma, poderá ver essa vantagem desaparecer aos poucos. Enquanto freela, considere aos poucos ir melhorando a qualidade do seu trabalho e ter esta estratégia como o ponto forte do seu negócio.
A dificuldade da proatividade
Quem trabalha como freelancer, sabe como é difícil ser produtivo trabalhando em casa. A organização do dia-a-dia, tanto das tarefas como do ambiente de trabalho, é um desafio no início de carreira. Todos os dias trabalho para melhorar um pouco mais nesse aspeto e os progressos têm sido visíveis, apesar de lentos. Quem trabalha com um chefe, não tem muita necessidade de evoluir a sua produtividade. Trabalha perante motivações exteriores (o dono da empresa) e o seu dia é gerido à base de ordens.
Para os freelancers, estas dificuldades já foram ultrapassadas. Desde os primeiros dias, o profissional é obrigado a ter a sua produtividade ao máximo. Quanto menos produzir, menos recebe. Por isso, quem trabalhar nesta área há muitos anos, terá uma vantagem considerável perante outra pessoa que esteja começando agora. Neste aspeto, os freelancers estão um passo à frente. Mesmo um jornalista que tenha sido despedido e queira começar a trabalhar como freela, poderá demorar meses até conseguir chegar ao nível de produtividade de um freelancer experiente.
Acredita que a crise pode ser uma oportunidade de negócio?
Enquanto todos veem uma situação como negativa, cabe a nós enquanto profissionais conseguir encontrar uma oportunidade de negócio em momentos menos positivos da economia. Na minha opinião e baseado em todos os fatores que apresentei acima, o trabalho de freelancer tem tudo para ser uma profissão de futuro. Especialmente para quem souber analisar as tendências de mercado, como o crescimento dos países angolanos.
Em primeiro lugar, os freelancer necessitam de sair um pouco da caixa e ver o mercado de uma forma mais abrangente. Sites para encontrar emprego são um bom método para conseguir projetos, mas há mais coisas que podemos fazer. Não se limite ao que todos fazem. Se a crise bater à porta do seu negócio, tente encontrar soluções para ultrapassar essa situação. E enquanto freelancer, tem o caminho aberto para melhorar o seu futuro.
“Na crise, enquanto um chora, o outro vende o lenço”